Praça do Sagrado Coração de Maria
(Praça dos Coqueiros).
Dores do Indaiá. S/d.
Foto de autor desconhecido.
Toda família possui seus membros ilustres. Das mais variadas formações, uns profissionais liberais, outros professores, intelectuais, escritores, outros comerciantes, fazendeiros, empresários ou funcionários públicos. Foram inúmeros os membros das famílias Corrêa, Fiúza, Coelho, Ribeiro, Sous(z)a, Oliveira, Cunha, Soares e outras originárias de Dores do Indaiá, cidade de pouco mais de 14 mil habitantes, do oeste de Minas Gerais (região do Alto São Francisco), Brasil, que contribuíram ou contribuem para o crescimento da cidade e da região, ou que partiram para outras terras como o Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e outros locais no País. Mas, as maiores colônias dessas famílias de Dores do Indaiá hoje residem em Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais. Atualmente, muitos de seus membros representam papel relevante na sociedade brasileira, como empresários, advogados, médicos, odontólogos, arquitetos, engenheiros, professores, administradores de empresas, escritores, fisioterapeutas, funcionários públicos, bancários, comerciantes, ruralistas e outras profissões.
Por se tratar de famílias numerosas, porém modestas, pouco laudatórias na divulgação dos méritos de seus membros, que não são poucos, decidimo-nos por esta empreitada: divulgar para as novas gerações dessas famílias um pouco do seu passado. É sabido que os mais jovens conhecem pouco sobre suas origens, fruto dos reflexos do mundo globalizado de hoje, em que tudo é feito às pressas, o trânsito é infernal, o trabalho massacrante, a competitividade da vida hodierna quase insuportável, tornando os cidadãos verdadeiras máquinas laborais, e com escassíssimo tempo para desfrutar do aconchego junto aos seus. E saber dos seus. É importante para poucos, hoje em dia, conhecer suas raízes. Os recursos da mídia eletrônica, entretanto, nos possibilitam quebrar esse círculo vicioso de desconhecimento do nosso passado.
Ao utilizarmos este Blog esperamos atenuar esse triste desconhecimento, pois nós somos o nosso passado. Como estudiosos dos fenômenos neurais da memória, há muito aprendemos que somos quem somos devido às nossas raízes, à nossa genética, à nossa herança cultural e social, à nossa história. Disso jamais poderemos escapar. Valorizar nossas raízes, saber o que aconteceu de bem (e também de mal) só nos pode ajudar em nossa caminhada atual e para que possamos construir um futuro melhor para nós, nossos filhos e netos.
É uma empreitada que, para muitos, pode ser considerada ingrata. Não para nós, pois, no outono da existência, ficaram para trás as veleidades juvenis, a timidez paralisante ou o arroubo impetuoso e temerário, as ilusões, os sonhos irrealizáveis, as ficções, as estórias inverossímeis. Ficaram, com a placidez do amadurecimento, a necessidade da busca constante pelo novo, pelo conhecimento, pela busca da cultura e da história, em particular de nossos ancestrais. Falta-nos hoje, em tempos em que o País vive uma crise pedagógica, cultural e de transmissão dos conhecimentos, exatamente esse conhecimento de quem somos e de onde viemos. Tomando emprestados conceitos do grande sociólogo polaco Zsigmunt Bauman, que descreveu magistralmente o que está acontecendo com nosso mundo hodierno, vivemos em uma era líquida, em que tudo se esvai, muda e desaparece rapidamente sem deixar rastro, desaparece como a espuma do mar na areia da praia, ressurge acolá de outra forma, em que tudo que é sólido se desmancha no ar, tudo se transforma e se esvai em pouquíssimo tempo, em que os costumes e a moral têm limites tênues e esgarçados e os valores culturais e éticos são pouco preservados. Essa sim é a hora em que se faz necessário voltarmos para o nosso passado e reaprender muitos dos valores que há muito se foram.
Este é um espaço para isso: a volta aos nossos valores ancestrais, para a rememoração de nossos entes queridos que se foram e deixaram muitas saudades, um momento em que, ao revê-los na tela do computador, possamos nos inspirar nos seus bons exemplos e falas. Ao mesmo tempo, aprender com seus erros e desacertos passados. Assim evitaremos a sua reincidência.
Igreja Matriz de N.S. das Dores e antigo Seminário,
em Dores do Indaiá. S/D. Foto de autor desconhecido.
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Ao iniciarmos este espaço, inevitalmente temos de falar na cidade mineira de Dores do Indaiá. Ela foi o berço gerador de todas essas famílias. Como Dores é uma cidade relativamente nova, seu primeiro povoado iniciou-se em 1798, e a emancipação como cidade somente ocorreu em 1885, é natural que nenhuma dessas famílias teve ali sua origem. Uma origem remota, de um passado que muitas vezes perde-se no tempo.
A busca desse passado é um trabalho árduo, difícil, que exige paciência, tempo e disposição. Por outro lado, é fascinante, pois, a cada momento, nos leva a deparar com novas descobertas e novas surpresas. Muitas vezes nos leva ao conhecimento de inter-relações antes inimagináveis e que estão lá nos livros de história, nas páginas dos registros cartoriais, na tradição oral das famílias, em seus álbuns e nas fotos antigas. Exige-se muito raciocínio para entender os meandros dessas trajetórias. Muitas vezes tem-se de partir de uma hipótese, de uma ideia quase ficcional, para se deslindar um mistério, um acontecimento pouco conhecido ou mantido secreto. É o trabalho de um verdadeiro garimpeiro, a descobrir ouro ou pedras preciosas onde menos se espera.
Também é um trabalho que exige honestidade pessoal e integridade para não se deturpar os fatos. É preciso também um mínimo de obediência aos parâmetros das investigações históricas, para não se incorrer no erro de criar apenas ficção. Fazer história não é o mesmo que escrever uma estória. Esta última depende mais da criatividade do autor, seu talento para imaginar casos e acontecimentos, alterá-los a seu gosto e escrevê-los. Mas, faz-se necessário que ao se escrever uma estória se diga o que está fazendo, para não enganar, iludir e criar falsas expectativas e imaginar um pretérito de glórias e honras, quando podem ter ocorrido fatos muito diversos. Escrever sobre a história é muito mais difícil. É necessário buscar fontes confiáveis, não uma ou duas, mas diversas fontes, e confrontá-las. É preciso a paciência de Jó para frequentar livrarias e bibliotecas, arquivos públicos e privados, procurar por textos avulsos e esparsos, visitar sebos, conversar com muita gente, saber separar o mito da realidade ao confrontar distintas opiniões. Hoje esse trabalho está muito facilitado com o advento da internet. Nela estão disponíveis obras, textos, mapas, roteiros, depoimentos que, no passado, poderiam levar nos levar a anos de pesquisas. Este é um trabalho que poderá perdurar por uma vida. Daí o respeito infundido pela figura do historiador, trabalhador ingente e dedicado, amante dos livros e de uma boa conversa de onde se podem extrair preciosidades. É o trabalho do que convencionalmente se chama o de "rato de biblioteca". É necessário saber que daquela confusão de obras e textos, alguma coisa útil pode ser produzida.
Dores do Indaiá. Outubro de 2013. Foto obtida do alto do morro da Capelinha. Ao fundo, como uma moldura, a monumental Serra da Saudade. |
Para iniciar este trabalho, decidimo-nos por divulgar o nome e a obra de um dos membros mais ilustres dessas famílias. Trata-se de Carlos Cunha Corrêa, irmão de nosso avô paterno Sebastião Corrêa de Souza, autor do primeiro livro que trata da história de Dores do Indaiá, muito antes que ilustres historiadores fizessem o seu belo trabalho. Seu livro é "Serra da Saudade", publicado em 1948, e que representou mais de vinte anos de pesquisas dedicadas nos arquivos, cartórios e instituições de história das grandes capitais do Sudeste, além de dezenas de entrevistas e leituras dos grandes historiadores do Brasil. Começamos por ele pois foi com seu livro que iniciamos nossas pesquisas.
Estamos desenvolvendo nosso trabalho a partir dessa grande obra nos legada há 69 anos e que permanece uma das mais importantes e sérias publicações sobre a história da região do Alto São Francisco. Entendemos o esforço que Carlos Cunha Corrêa despendeu em sua labuta. Pesquisar história é, como falamos, muito difícil. Possuidor de uma cultura invejável, enciclopédica mesmo, dono de um estilo invulgar e com total domínio do vernáculo, o autor nos brindou com uma obra cativante do início ao fim. De se ressaltar o fato dele ter bebido em fontes limpas. Entre os historiadores por ele consultados estão obras dos grandes como Auguste de Saint-Hilaire, Alfredo Ellis Júnior, Gilberto Freyre, Oliveira Viana, Pandiá Calógeras, Pedro Calmon, Capistrano de Abreu, Salomão de Vasconcelos, Diogo de Vasconcelos, Caio Prado Júnior, Padre Serafim Leite (autor da monumental "História da Companhia de Jesus no Brasil"), Euclides da Cunha, Theodoro Sampaio, Sergio Buarque de Holanda, Moacir Silva e muitos outros. Discorre sobre a história do Brasil, em particular do Sudeste e, mais particularmente ainda, sobre o desbravamento do oeste do rio São Francisco, uma região antes conhecida como Campo Grande (que engloba todo o Alto São Francisco), como se fosse um historiador. Mas não o era. Aí está um grande mérito. Carlos Cunha Corrêa foi um eminente advogado em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, para onde se mudou com a família em 1942.
Vamos nos socorrer na breve biografia escrita por seu filho, o almirante reformado José Nazareno França Corrêa. No ano de 2000, quando do lançamento da obra de nosso tio-avô intitulada Amores do Inconfidente, Nazareno teve a amabilidade de presentear-nos com um exemplar autografado desta obra super-interessante para quem, como nossa família, tem origens nas margens do velho “Picadão dos Guaiases”, também conhecida como Picada de Goiás, a trilha primitiva que rasgava a Capitania de Minas Gerais de leste a oeste, que nos séculos XVII e XVIII serviu como ponto de passagem das caravanas, dos bandeirantes e desbravadores do centro-oeste, de tropas que demandavam o triângulo mineiro, Goiás e outras áreas do interior do País.
Assim escreve o filho sobre seu ilustre pai:
Carlos Cunha Corrêa nasceu em Dores do Indaiá, aos 10 de agosto de 1882, e faleceu no Rio de Janeiro em 23 de outubro de 1951, aos 69 anos, portanto.
Após cinco anos de estudos no Seminário de Mariana, onde se tornou exímio conhecedor do Latim entre outras matérias que só os seminários ministravam naquela época, entrou na Faculdade de direito de Minas Gerais, em Belo Horizonte (tendo, antes, passado pelo Caraça em curta estada). Uma fez formado, retornou à sua terra natal, onde exerceu o cargo de Promotor Público, tendo desposado Albertina Gontijo da Cunha.
Por volta de 1914, transferiu-se para Pitangui, assumindo o cargo de Delegado, do qual se exonerou, algum tempo depois, para dedicar-se, exclusivamente, às atividades da advocacia, com excepcional competência, tanto que acabou se mudando para Belo Horizonte, em 1926, onde o campo para profissionais do Direito era bem mais amplo e convidativo.
Além disso, montou também um escritório de Procurações. Em 1942, a família mudou-se para o Rio de Janeiro, tendo Carlos Cunha Corrêa iniciado uma velha aspiração, que as atividades profissionais até então o impediam: a pesquisa sobre etnia, formação da sociedade, e genealogia da região oeste do Estado de Minas, inclusive os caminhos de penetração das Entradas e Bandeiras naquela região.
Resultado dessa pesquisa histórica e estudos correlatos (junto a cartórios, igrejas, bibliotecas e entrevistas) foi a autoria de dois livros: “Serra da Saudade”, publicado em 1948 (edição esgotada) e o presente romance histórico, só agora vindo a lume, após quase meio século de seu falecimento (1951).
Convém lembrar que, em virtude de tratar-se de um texto redigido no final da década de 40, tornou-se recomendável a inclusão de um pequeno glossário, que, certamente, facilitará a sua leitura.
José Nazareno França Corrêa
Carlos Cunha Corrêa foi um ilustre advogado em Belo Horizonte tendo sido reconhecido como possuidor de grande competência profissional além de ter sido um homem letrado que cultivou a amizade de outros ilustres próceres de sua época, como o governador de Minas Gerais, Milton Campos, que fora seu colega de turma na faculdade.
Seu livro "Serra da Saudade" foi concluído em 1948, após exaustivas pesquisas em cartórios, bibliotecas, igrejas e entrevistas pessoais. Sua conclusão se deu na Fazenda das Gerais, em Dores do Indaiá, fazenda que foi criada e pertenceu a um dos fundadores de Dores do Indaiá, Manuel Gomes Batista, o suposto descobridor do "diamante do Abaeté", e que, desde 1935, pertencia a José de Oliveira (Zé da Carlota), meu tio-avô, pelo meu lado materno e grande amigo de Carlos Cunha Corrêa. Tornou-se uma obra de referência não somente para a história de Dores, como de toda a região do Oeste, Alto São Francisco, Triângulo Mineiro, Alto do Paranaíba, como também de Minas Gerais, como o atestaram em diversas ocasiões historiadores do porte do prof. Waldemar de Almeida Barbosa.
Este livro raro, de edição esgotada logo após seu lançamento, é uma das jóias de nossa biblioteca, onde é guardado em local de destaque. Foi-nos presenteado em 1965 pelo nosso pai, Dilermando Corrêa de Souza, que o recebeu carinhosamente do tio, Carlos Cunha Corrêa, que era seu padrinho de batismo. Vale notar que numa de suas páginas antes do prefácio está assim redigido: “Incide em contrafação o exemplar não rubricado pelo Autor (em maiúsculo, no original)”. Segue-se a rubrica de nosso ilustre tio-avô. Uma relíquia, sem a menor sombra de dúvida, que foi devidamente encadernada com capa dura logo que o ganhamos e preservado com cuidado, malgrado a ação do tempo que tem amarelado e manchado suas páginas. A dedicatória está assim: “Ao Dr. Milton Soares Campos, mineiro de escol, expoente da tradição democrática montanheza (SIC), homenagem sincera do Autor”. Como se sabe, não se fazem homens probos na política como antigamente.
Agora, tomamos a liberdade de reproduzir em pequenas partes, alguns trechos mais significativos desta obra marcante e original, que antecipou em 16 anos outra obra de referência que é “Dores do Indaiá do Passado”, de autoria do prof. Waldemar de Almeida Barbosa, de 1964. Esta também é uma obra que guardamos com muito carinho em nossa biblioteca. Já está disponibilizada para todos os interessados a obra digitalizada de Carlos Cunha Corrêa, no Google, no formato PDF, já que se trata de uma obra de utilidade e de domínio públicos, pois já estão se completanto 70 anos de sua publicação. Não conseguimos contatar os herdeiros de Carlos Cunha Corrêa. Seus filhos são todos falecidos e os netos residem no Rio de Janeiro.
A obra é dividida em 3 partes:
Primeira Parte – A Formação Nacional – em que aborda as origens do Brasil, suas principais correntes migratórias durante a colonização, as guerras, os europeus que aqui aportaram, os índios, os negros e a miscigenação que daí ocorreu;
Segunda Parte – Gênese e Evolução de Dores do Indaiá – em que aborda os acidentes geográficos, as expedições nos séculos XVII e XVIII, as lendas, os primeiros núcleos habitacionais, os quartéis, os quilombos, as capelinhas, as fazendas, a construção da cidade de Dores, um apanhado dos hábitos, da rotina e da moral dos primeiros habitantes e, entre outras famílias abordadas, um capítulo dedicado aos Corrêas e seu devido quadro genealógico;
Terceira Parte – Influência Nordestina – em que aborda a importância dessa região do Brasil na aculturação de nossas Minas Gerais.
O que vamos reproduzir, na próxima postagem, na íntegra, é o Capítulo VI da Segunda Parte, intitulado “A Serra da Saudade”, para que possamos entender um pouco mais de onde veio o nome tanto da serra que embeleza a paisagem de Dores, como a origem do nome da cidade. Com uma estética lingüística e um estilo ímpares e escorreitos, Carlos Cunha Corrêa nos dá uma lição de História usando sua eloqüência camoniana.
Sou eternamente grato por ter visto uma foto do meu bisavo Francesco Pinto de Oliveira (chico Italiano). Meu contato agnaldooliveira78@yahoo.com.br. Deus te abençoe Dr.Antonio Carlos Correia de Oliveira. Shalom Adonai.
ResponderExcluirSou eternamente grato por ter visto uma foto do meu bisavo Francesco Pinto de Oliveira (chico Italiano). Meu contato agnaldooliveira78@yahoo.com.br. Deus te abençoe Dr.Antonio Carlos Correia de Oliveira. Shalom Adonai.
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